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Crónicas de uma mãe atrapalhada 2: O Meu Menino Talismã

Um dia escrevi sobre as aventuras e desventuras das delícias da maternidade e do milagre da vida! Este é a continuação dessas aventuras com um menino especial com autismo e um raro síndrome de deleção 18P

Crónicas de uma mãe atrapalhada 2: O Meu Menino Talismã

Um dia escrevi sobre as aventuras e desventuras das delícias da maternidade e do milagre da vida! Este é a continuação dessas aventuras com um menino especial com autismo e um raro síndrome de deleção 18P

A saga do diagnostico de Autismo do meu filho!

Estou no consultório da médica, que foi a minha grande ajuda no encaminhamento do Gonçalo a Drª Petra Chaves, quando o Gonçalo que pouco ou nada verbaliza, no seu jeitinho muito próprio a pega pela mão pega pela mão e lhe aponta a Escala Visual de dor que ela tem no consultório,Sempre carinhosa e atenciosa com o Gonçalo retira a escala da parede e de acordo com as carinhas de emoções (smiles) que acompanham os valores, vai perguntando ao Gonçalo. Ele identifica zangado, triste e feliz.

-E como é que tu estás agora?

Sem hesitar com um grande sorriso ele responde:

-"Feli..."

Todos sorrimos. E o meu coração ficou apertadinho a pensar que este menino tinha nascido para me ensinar a genuína felicidade. Eu só pensava como é que este menino, que já passou por tanto, diz que é Feliz.

Eu já era mãe de uma menina fantástica, mas eu não queria que ela fosse filha única, a minha instabilidade profissional levou-me a adiar esse sonho por diversas vezes. Até que decidimos ou era naquela altura ou já não era. Já estava com 42 anos, mas tinha tido a primeira filha aos 36 e tudo tinha corrido bem. No primeiro mês de Gravidez a Bárbara contraiu uma conjuntivite grave e contagiou-me. Tive febres altas e fiquei com algum medo, mas passou. No entanto, por isso e pela idade durante o primeiro trimestre fizemos segredo, só algumas pessoas muito próximas e a minhas chefes de trabalho sabiam.

Não me posso queixar da gravidez, no geral sentia-me bem e trabalhei até aos cinco meses altura em que levei um encontrão de uma aluna no corredor. Depois desse episódio, porque vomitava com frequência todas as manhãs e porque andava mais nervosa, o médico pôs-me em casa por Gravidez de Risco devido ao stress e por estar sujeita a que a cena do encontrão se repetisse, pois nessa consulta apanhámos um susto, por ter sido difícil ouvir os batimentos cardíacos do bebé na enfermagem, o médico acabou por fazer um eco ao coração e estava tudo bem, deixando-me menos ansiosa. Tirando isso a gravidez decorreu normalíssima, por conselho do obstetra que me seguiu não fiz amniocentese, optei pelo teste genético que dava os mesmos resultados e não era invasivo. Os resultados não indicavam nada de negativo. Pelo que fomos em frente com a gravidez. O parto foi induzido porque temíamos que fosse para o fim de semana e eu não prescindia do meu obstetra que não fazia urgências. Tinha tido uma má experiência no parto da minha filha e não a quis repetir.

Assim no dia 19 de Janeiro dei à luz o Gonçalo num parto maravilhoso que o pai registou. Era um bebé dócil, mamava e dormia lindamente. Os primeiros dois dias na maternidade do Hospital foram de pura felicidade. Mas ao terceiro dia o meu mundo desabava. Assim que a minha filha entra no quarto com o meu marido, quando me iam ver a primeira coisa que faz é vomitar violentamente. Foram de imediato para as urgências. Pai e filha tinham uma gastroenterite. Eu tinha um recém-nascido de três dias e não me podia aproximar da minha filha! Estava sozinha com um recém-nascido e não podia ter ninguém a ajudar-me.

Ao fim de três dias pude abraçar a minha filha que se ressentiu de estar doente e não ter mimo da mãe. Mas tudo passa. O Gonçalo era um bebé cheio de vida e gostava de chamar a atenção quando não lhe davam. Dizia "Oiá Oiá" aos seis meses, e era conhecido como o bebé simpático nas lojas onde ia e no centro de saúde. Gatinhou aos nove meses e andou aos dezoito. Mais ou menos a partir dos doze meses do Gonçalo, um daqueles instintos que só as mães têm diziam-me que alguma coisa estava errada. O menino tinha deixado de falar, não respondia quando o chamávamos e deixou de fazer as gracinhas. Estava agitado, dormia mal. Mordia as pessoas. Atirava-se para o chão.

Aos dezoito meses desequilibrou-se sobre os meus pés e partiu a cabeça, fizeram-me esperar uma hora como menino a deitar sangue na cabeça para o colarem (em vez de coser). Uma vez, numa loja dei por ele a alinhar as bolinhas de sabão. Numa festa de aniversário de um coleguinha da Bá, o pai do menino aniversariante reparou que ele na piscina de bolas se entretera a separá-las por cores. Mas depois nunca mais o vi fazer nada parecido, o meu alarme de mãe, porém, não parava. Comecei a devorar artigos sobre o ato de morder nas crianças, tudo indicava para problemas de comunicação e de audição. Nas consultas de rotina do Gonçalo estava sempre tudo bem. Era uma fase normal que haveria de passar.

Por minha iniciativa marquei uma consulta de otorrino. No entanto tive de adiar a consulta porque nessa mesma altura a minha filha com 9 anos era internada nos cuidados intermédios com uma pneumonia. Só consegui a consulta três meses depois. Eu passava parte das manhãs a brincar com ele. Mas o comportamento piorava de dia para dia estava mais agitado Escondia-se atrás de mim quando outras crianças o desafiavam a brincar. Eu achava que era dele ter estado sozinho na ama, e depois ter ficado sozinho comigo, para ele melhorar, apesar de estar desempregada na altura decidi pô-lo na Creche e aí o inferno começou. Os primeiros meses correu tudo bem. Até mudar de sala e de Educadora.

A entrada de uma nova educadora coincidiu com uma viagem do pai e o comportamento ficou mais alterado, mordia, atirava-se para o chão e tinha e tem uma força enorme que tornava difícil dominá-lo. Entretanto a educadora confirmou-me que não era normal ele não falar com a idade que tinha. Fui com o Gonçalo ao Pediatra em quem tinha confiança. Falei na possibilidade de autismo, e ele respondeu que não, que o menino só precisava ser mais estimulado. Eu tinha conseguido trabalho e tirava um curso de fotografia à noite. O menino passava muito tempo com o pai e a irmã. Percorri vários médicos, passei manhãs ao frio para ser atendida no centro de saúde e estava sempre tudo bem nas consultas. E o meu coração dizia-me que não. Tentei informar-me sobre possibilidade de autismo mandaram verificar a audição dele. Entretanto na consulta de Otorrino, este disse que os tímpanos estavam bons, mas mandou-lhe fazer exames, pelos quais tive de esperar três meses. Como não colaborou no audiograma, fez só o tímpanograma.

Quando tive os resultados na mão, não queria acreditar no que via: no de irmã as curvas estavam normais, no dele dava zero em ambos os tímpanos. O som não entrava. O Gonçalo crescia no silêncio, não ouvia por isso não falava. Senti-me a pior mãe do mundo. Como é que não tinha percebido? A resposta veio por uma colega de trabalho que passara pelo mesmo e depois pelo Otorrino: Otites serosas que não davam sintomas nem sinais. Fez um E.R.A.) Exame aos nervos auditivos) com anestesia geral porque de outra a forma não colaborava. Os nervos estavam bem, era só nos tímpanos. Fez-se um tratamento com gotas, com remédios e depois da praia, parecia ter melhorado. Mas voltou a morder e atirar-se para o chão assim que o Outono começou. Nova consulta de otorrino. Novos exames e de novo as linhas retas. O Zero. O silêncio. Novo Era, com anestesia geral. Lembro-me de ter passado uma tarde em que não fiz nada a não ser olhar aqueles gráficos e depois chegar ao médico e reclamar que não estava tudo bem. O médico combinou então a operação. As consultas de Otorrino tinham começado em Fevereiro de um ano, e só em Abril do outro, já com três anos, foi operado e pôs os tubinhos. O Otorrino disse que tinha os adenoides a bloquear-lhe a audição.

Aos três anos já tinha levado três anestesias gerais. Mas a evolução após a operação não foi a esperada. Por minha iniciativa recorri a uma terapeuta da fala, a minha querida Diana Ribeiro do SIAC e a um Psicólogo Manuel Ferreira com quem tinha trabalhado. Ambos me ajudaram imenso. Por conselho da Diana procurei uma Pediatra de desenvolvimento particular. Nessa pediatra fez testes onde foi diagnosticado com T.E.A. No entanto a operação tinha sido recente. Fui levar os papéis em mão para pedir intervenção precoce. Não tinha resposta. Cheguei a falar com a responsável que me disse ter muitos processos e que dentro de quinze dias me ligaria. Nunca ligou. O Gonçalo, entretanto, fez novo E.R.A com anestesia geral a quarta. Estava tudo bem. Mas o comportamento mantinha-se. Não fazia o que lhe dizíamos e frustrava. Na escola era um inferno com as queixas de ele ter batido nos colegas. Quando cheguei a assistir baterem nele e depois dizerem que foi ele.

Acabou por mudar de escola e evoluiu muito. Deu com uma equipa de pré-escolar e educação especial muito boa. Ao fim de três meses estavam encantados com ele. Entretanto foi-me atribuída como médica de família a Drª Petra Chaves que o encaminhou para ser acompanhado por especialistas, ao fim de muitas consultas de Pediatria de Desenvolvimento, Psicologia, análises e exames nos quais mais uma anestesia geral, a quinta, aos cinco anos o Gonçalo teve o diagnóstico que o meu coração de mãe sempre alarmou: Transtorno do Espectro do Autismo. Se é fácil, não. Muitas das vezes as pessoas confundem os comportamentos dele com falta de educação. E quando explico é comum ouvir "ah, mas ele é tão bonito!!!". Pois o autismo é invisível, até o conhecermos. A culpa de não o ter ajudado mais cedo, assombra muitas vezes. E se foi da conjuntivite, ou da gastroenterite que afetaram e se não tivesse adiado a gravidez, mas depois lembro-me que nada disso ajuda o meu filho.

Diagnóstico de autismo é como se sentíssemos um murro no estômago. Temos um filho que parece desenvolver-se normalmente e de repente o chão abre-se debaixo dos nossos pés. Mas isso não é o fim da história, é só mesmo o início.


O pai e a irmã, principalmente esta, têm sido os meus pilares. Ele é o meu docinho de côco, doce como só ele pode ser, o meu menino "Feliz" sem maldade, puro de coração. E como a irmã diz: à maneira dele é muito inteligente." E como todos nós amamos o nosso anjo azul

Este testemunho foi publicado no blog www.guerreiracarolina.br a convite da autora.